Primeiras Impressões: Rin (do mesmo autor de Beck)

Primeiras Impressões: Rin (do mesmo autor de Beck)

14/07/2018 0 Por Crive

(Originalmente este texto foi escrito para o extinto blog Ecchi Must Die! em 7 de Março de 2014, sendo colocado na íntegra com pequenas modificações).


Após finalizar a publicação de seu consagrado mangá Beck em maio de 2008, Harold Sakuishi demorou quatro anos para prosseguir sua carreira de mangaka em uma publicação contínua. Foi então que em dezembro de 2012, Harold volta a revista que o reconheceu para dar vida à uma história metalinguística, um tipo de enredo que era moda na estréia do mangá (2012), vide o sucesso de Bakuman na época. E por mais que haja várias divergências entre a nova obra de Harold e o já finalizado mangá da dupla Ohba/Obata é muito difícil não compará-los, até porque Harold parece parodiar o tempo todo o mangá que popularizou o gênero.

Rin não tem como protagonista o inteligente roteirista Takagi e nem o talentoso quadrinista Mashiro. O enredo é centrado em Fushimi, um garoto sem dom artístico e sem muito talento na sua vida escolar. Sua única qualidade, a princípio, está em persistir vigorosamente no seu sonho, este de se tornar famoso mangaka, algo que planeja desde criança e que não dispõe de nenhum dilema moral contrário (como o suicídio de um tio que era mangaka).

 

E é nesse aspecto que Rin se mostra com uma visão um tanto mais realista e com uma leitura bem mais fluída em relação a Bakuman. Enquanto o mangá da Shounen Jump demora um volume inteiro para entregar o primeiro rascunho à um editor, o one-shot de Fushimi é recusado com pouco mais de 20 páginas do primeiro tankohon. A cena em questão mostra um editor frio que recusa o mangá rapidamente com as seguintes frases : “Suas linhas não são muito limpas, seu diálogo está sem sentido, seu character design é muito pouco realista, hm… talvez você devesse desistir “.

Nessa passagem ficou claro que Rin está livre das algemas que Bakuman esteve preso, a revista de publicação. O primeiro editor da Shueisha de Bakuman, o senhor Hattori, foi extremamente gentil e mesmo desgostando do mangá dos iniciantes, os cativou a continuar escrevendo, mesmo partindo da revista mais “ditatorial” do Japão. Ao passo que o editor da Kodansha (dona da Shounen Magazine) pôde ser muito duro em Rin, demonstrando que mesmo o mangá sendo publicado na Kodansha, críticas partindo da obra são bem vindas ou são maus necessários para enfatizar a difícil vida de um mangaka.

Na parte artística, Rin parece ser uma evolução do que Beck foi. O estilo do traço é o mesmo, com cenários bem simples, ótima sensualização do corpo feminino e o que Harold faz melhor, personagens estilosos, neste caso os sinistros produtores musicais e rappers de Beck deram lugar aos yakuzas e editores em Rin. O diferencial na arte da nova obra em relação ao seu mangá anterior está nas várias expressões caricatas que o autor coloca nos personagens em Rin, dependendo da situação.

Entretanto, a maior carta do mangá está na narrativa bem leve de Harold. A parte visual é tão importante quanto o texto para compor a narrativa, e é nesse aspecto que o autor faz balões discretos nos quadros e passagens de cenas bem dinâmicas, sem enrolação quanto ao objetivo da cena em questão. A característica mais marcante está na narração do protagonista quanto a situação que está vivenciando, Harold brinca na composição de quadros com pensamentos de Fushimi. A página ao lado explícita isso, quando o autor compõe a personagem Honda usando biquíni na escola para demonstrar a lembrança de Fushimi por tê-la visto nestes trajes. Tal atributo ainda contrapõe Bakuman, visto que este é marcado por quadros saturados de balões de fala expositivos, tornando um mangá extremamente “pesado”.

Um atributo interessante de Beck também presente em Rin é a quantidade de referências que o autor coloca. Logo nas primeiras páginas vemos Fushimi escutando um CD da banda Beck, na parte editorial vemos várias referências a editores famosos da Kodansha e também na cena mais doce do volume, uma belíssima homenagem a Osamu Tezuka. Algo que eu gostaria que vocês lessem para ficarem surpresos com o desfecho desta sequência.

  

Apesar das continuas arremedações a Bakuman, o que mais me espantou durante esta minha estréia foi seu nome, “o que diabos é Rin?”.  Foi então que o autor nos apresentou o que seria uma segunda protagonista(?), Ishidou Rin, uma garota bonita e misteriosa que aparenta não se importar com as múltiplas chances que empresários dão a ela para se tornar uma estrela. Em sua cena de estréia, Rin é totalmente distinta de Maho (Beck), indiferente, mais frígida e essencialmente discreta.

Contudo, a trama de Rin parece estar um tanto distante do enredo realista de Fushimi. Até porque em uma segunda leitura, Rin se mostra uma personagem que possui poderes telepáticos de prever o futuro o que causa danos físicos a ela. Nesse panorama é um tanto quanto difícil trabalhar esta temática, uma sobre um garoto sem talento tentando se tornar um autor de sucesso e outra sobre um garota com poderes recusando propostas de se tornar uma estrela.

Isto posto, o dever de Harold era entrelaçar o enredo de ambos personagens para então levar o leitor ao que seria o objetivo do mangá, entretanto, é nesse caminho que o manga peca. A até então jornada desgastante de Fushimi se torna um antro de superação. Durante as suas férias de verão, Fushimi motivado pelo seu autor favorito treina sua arte sem parar e é recompensado muito rapidamente com vitória em um prêmio para iniciantes.

A cena a qual Fushimi descobre que venceu tem até uma grande carga dramática, todavia, é inconsistente vide que poucas páginas atrás este garoto estava sendo encorajado pela mesma revista a desistir, ou seja, o treinamento não convence o leitor a aceitar esse fato. Por mais que o mangá tenha perdido um pouco do tom realista com este ato, ainda sim já é exibido um desenvolvimento de personagem no primeiro volume. Após Fushimi vencer é notável seu ganho de confiança, podendo assim esbanjar um tanto do orgulho quanto a seu feito, coisa que Mashiro nunca fez. O garoto que era totalmente tímido no começo do volume pôde então, ao decorrer deste, tomar coragem para conversar com Honda, a garota que gosta, falando sobre o assunto que mais conhece, os mangás.

E por fim, temos o famigerado encontro de Rin e Fushimi no final do volume. Em uma festa da editora, são convidados o premiado Fushimi e a nomeada estrela Rin, os quais não tem contato em seu primeiro encontro pois a narrativa foca em outro personagem que novamente parece parodiar Bakuman. Nessa trecho é exposto o rival de Fushimi, um gênio de 17 anos que levou o prêmio máximo do festival, como o editor diz: ” Aquele tipo de autor que aparece de 10 em 10 anos”. Vou ser sincero, antes que as característica físicas do personagem fossem mostradas eu poderia jurar que iria aparecer um remodelamento de Niizuma Eiji.

Foi quando a personalidade do gênio Taki Kaito foi inaugurada que pude entender (ou tentar) o que Harold estava fazendo assemelhando tanto os passos de Fushimi ao do pseudônimo Ashirogi Muto. Harold parece travar essas comparações propositalmente, pois é notável que mesmo que a jornada seja muito parecida, os personagens do primeiro volume de Rin aparentam ser bem mais ricos em conteúdo se compararmos as caricaturas de Bakuman. Taki Kaito é um jovem normal que consegue agir como qualquer outro, está longe das excentricidades que “justificavam” a genialidade de Eiji.

 

Aliás, o mangá de Harold parece ser uma resposta a descrição nada fiel desta realidade editorial realizada por Ohba/Obata. O romance exposto está longe de uma idealização, os personagens fogem de um esteriótipo e o mercado editorial não é composto somente por editores apaixonados por mangas. Contudo, esse é realmente o objetivo de Rin? Ao menos a página final do volume deixa muitas dúvidas.

“Qual é o intuito dos poderes de Rin ?”,” O que Rin vai representar para a vida de Fushimi?” . Antes que essas perguntas fossem respondidas o autor fecha o volume com o início do que seria o primeiro diálogo dos dois protagonista. Com esse final de volume eu poderia dizer que é bem difícil aplacar o rumo que a história irá tomar, mas sem sombra de dúvida Harold conseguiu levar esse curioso ao segundo volume não só pelos personagens que ele começou a construir ou pela jornada de Fushimi, mas fundamentalmente pelos mistérios que ele criou.

Atualmente, RiN já é um mangá finalizado com 14 volumes sendo que o último foi publicado em Abril de 2016. Eu retomei esse texto pois pretendo terminar de ler o mangá e postar uma review um pouco mais completa quando finalizar.